sábado, 18 de março de 2017

Consumir Animais: Um Papelão

A deflagração da Operação Carne Fraca (maior ação na história da Polícia Federal), é apenas um detalhe. Sim, um mero detalhe. Um mero detalhe dentro do universo no qual está inserida a indústria de animais para consumo.

O Brasil é um país que orgulha-se de matar, em um único segundo, 1 boi, 1 porco e aproximadamente 190 frangos. Em um mísero segundo. É uma matança sem precedentes. Um massacre de indivíduos conscientes, sencientes, inocentes.

Após a Declaração De Cambridge Sobre A Consciência Animal¹, nenhuma indústria que usa animais deveria se manter funcionando. Nenhuma. Só que grande parcela dos humanos se mostra mais interessada em ganhar dinheiro e obter prazer, custe o que custar, seja da forma que for. E esse "custe o que custar", essa "forma que for" incluem a exploração, o confinamento, a tortura e a matança sistemática de indivíduos conscientes, sencientes, inocentes. 

Ora, se já sabemos que animais não humanos sentem dor e sofrem, por que impôr dor e sofrimento a eles? Se já sabemos que eles possuem interesse na própria liberdade, por que privá-los disso? Em nome do quê? Pergunta retórica: de dinheiro e prazer. 

Esse cenário de indiferença à dor e ao sofrimento alheio é o de uma grave crise ética. Uma profunda crise civilizatória. Uma crise da qual desencadeiam todas as outras, pois se uma sociedade não se sustenta eticamente, ela não se sustentará em esfera alguma.

Nas redes sociais (incluindo o Facebook, o Twitter, o Instagram e o Whatsapp, para somente citar essas quatro), o assunto sobre a Operação Carne Fraca é altamente debatido desde o momento em que virou notícia. De tantas publicações, poucas propõem um aprofundamento do debate sobre nossa relação com as outras espécies. Majoritariamente, a preocupação é com o fato de haver papelão misturado aos pedaços de animais mutilados (eufemisticamente chamados de carne).

É como se, algumas décadas atrás, polemizássemos sobre campos de concentração sem inspeção sanitária em vez de protestarmos pelo fato de haver pessoas sendo sistematicamente mortas no Holocausto. É como declarar algo do tipo: "massacra, mas massacra com alguma higiene".

Precisamos entender que uma injustiça é caso de polícia não por questões operacionais, mas por questões morais. Neste cenário, não há que se discutir sobre a carne de um animal ser comercializada "fora do prazo de validade". Toda carne de animal consumida já é "vencida": é a ética sendo "vencida" pelo egoísmo.

Compreender que animais - humanos e não humanos - são dotados de senciência e, mesmo assim, consumí-los? Esse é o maior papelão nessa história toda. História na qual a Operação Carne Fraca é apenas um detalhe.


Instalações da JBS, conforme propaganda. Quantas vítimas você é capaz de ver nessa imagem?


¹Declaração De Cambridge Sobre A Consciência Animal: 

Nós declaramos o seguinte: 

"A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que os animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente como a capacidade de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e as aves, e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos neurológicos".